Cesário Verde

A 25 de Fevereiro de 1855, nasceu José Joaquim Cesário Verde, filho de José Anastácio verde e de Maria da Piedade dos Santos Verdes. O pai era um abastado comerciante de ferragens e de outras mercancias. Olhando para trás, parece que as distâncias a nível geográfico se encurtaram. Hoje, tudo está, assim o parece, mais próximo. Quando Cesário Verde tinha dois anos, o pai comprou uma quinta em Linda-a-Pastora, para que, assim, no “campo”, pudessem fugir à Febre Amarela que assolava Lisboa.

 

As nortadas levariam para longe a doença e, foi assim que o futuro poeta, iniciou o seu contacto com a quinta de Linda-a-Pastora, de onde retirou, ao longo da sua curta vida, grandes períodos de descanso e prazer.

 

Nasceu num tempo onde “as coisas da literatura”, não eram muito bem vistas. Seu pai encaminhou-o, desde cedo, para o ajudar na sua loja de ferragens, em plena Lisboa. Lá tinha, acima de tudo, a incumbência de escrever cartas comerciais a devedores. Por vezes, também atendia ao balcão quando o seu pai estava na quinta a tratar da agricultura e das roseiras que tanto gostava. Desta forma, Cesário Verde estava livre do olhar paternal, o mesmo acontecendo quando ia para a quinta, tendo o pai que ir tomar conta da loja. O poeta teve liberdade para se dedicar à sua prosa, aos seus poemas, sem o olhar crítico do pai.

 

Er um burguês. Um liberal e anticlerical convicto. Desde sempre um verdadeiro republicano e um observador atento das gentes. Amava olhar a cidade, quando o sol já se ia no horizonte. E era um verdadeiro amante da natureza, quanto da sua quinta se deslumbrava com o vale do Jamor.

 

É fácil imaginá-lo ao balcão, a atender a clientela com gestos cuidados, vestido um conjunto elegante. Sim, porque Cesário Verde era um Homem meticuloso, cuidadoso e vaidoso. Fialho de Almeida define-o da seguinte forma: «… alto e mui grave (…) tinha bem a figura do carácter, e não se podia mirá-lo sem logo lhe ver, na ingénua arrogância, o quer que fosse do ser filtrado misteriosamente por uma estranha e aristocrática seleção. O tipo era seco, com uma ossatura poderosa, a pele de fêmea loira, rosada de bom sangue, a cabeça pequena e grega, com uma testa magnifica, e feições redondas, onde os olhos amarelos-pardos de estátua, ligeiramente míopes, tinham a expressão profunda, rectilínea, longínqua (…)».

 

O poeta sofre o primeiro grande revés da sua vida, quando, em 1872, depois de uma longa luta contra a terrível tuberculose, a sua irmã Maria Júlia acaba por sucumbir à doença. Contava apenas 19 anos de idade. É um Linda-a-Pastora que vai tentar amenizar sua dor. No entanto, terá de voltar a Lisboa para continuar o seu trabalho na loja de seu pai. Trabalho este que cada vez lhe agrada menos. Que longe está da sua vontade de escrita. De ordenar palavras. De fazer versos meticulosamente arranjados. À noite, gosta de passear por Lisboa, observar mulheres magras, como as atrizes do teatro, ao contrário do gosto mais generalizado – o gosto pelas formas redondas. Vai escrevendo uma ou outra coisa. Um ou outro verso. Frequenta o café “ O Martinho da Arcada”, onde se vive um ambiente de leitura, de crítica à sociedade. Não sabe como pode publicar oso seus poemas, quando resolve ir ter com um antigo empregado do seu pai, Eduardo Coelho, um apaixonado pela escrita, que entretanto se tinha tornado um dos diretores do Diário de Notícias. Este fica encantado com os poemas de Cesário. Promete publicá-lo no seu jornal. E assim acontece a 12 de Novembro de 1873.

 

O menino que nasceu louro e de olhos claros, transformara-se num poeta cuidado, onde em cada verso emerge uma modernidade oitocentista. Uma poesia que surge cheia de inovações.

 

O caminho entre Lisboa e Linda-a-Pastora é sobejamente calcorreado. Divide o seu tempo entre lá e cá. E podemos verificar, por alguns de seus versos, o muito que o une à quinta: «Hoje eu sei quanto custam a criar // As cepas, desde que eu as podo e empo. A! O Campo não é um passatempo // com bucolismos, rouxinóis, luar.»

 

Em 1877, em carta a António de Macedo, Cesário queixa-se de parca saúde: “Fiquei hoje em casa, um pouco adoentado, com suposições de doenças (…) confusamente baço…”. A tosse começa a atormenta-lo. A dor no peito é uma constante. A tuberculose apanha-o, e trava uma luta que acaba por vencer o poeta, aos 31 anos. Estávamos no ano de 1886. As suas últimas palavras recolhidas pelo único filho sobrevivente do Sr. Anastácio Verde foram: “Não quero nada, deixa-me dormir”.

 

Uma vida curta que deixará marcas profundas em muitos, que depois dele o chamaram de mestre, tal como o fez Fernando Pessoa.

 

ROCHA, Carla – «Casa de Cesário Verde em Linda-a-Pastora». Conhecer Oeiras nº 4. Oeiras: Câmara Municipal de Oeiras, 2004