José Monteiro da Rocha pode não ser um nome sobejamente conhecido para o comum dos mortais, mas é incontornável para os apaixonados e conhecedores da Matemática e Astronomia.
Nasceu a 25 de Junho de 1734, em Canaveses, mas cedo foi viver para o Brasil. Presume-se que tenha sido educado por jesuítas o que, provavelmente, foi fator predominante para ele próprio abarcar a fé e se tornar inaciano, em 1752.
Com a expulsão dos Jesuítas de Portugal em 1759, Monteiro da Rocha abandonou a ordem religiosa e foi ordenado padre secular na Baía, um ano depois. Já padre, regressou a Portugal e foi para Coimbra frequentar a Universidade, e por lá ficou de 1766 a 1770, formando-se em Cânones.
No entretanto, o Marquês de Pombal encetava a Reforma de 1772, e o reitor da Universidade de Coimbra, D. Francisco de Lemos, recomendou a Sebastião José de Carvalho e Melo o nome de Monteiro da Rocha, para colaborar no projeto, em virtude de seu interesse pelas ciências. Foi, então, um dos encarregados de elaborar os estatutos da Universidade, ficando ao seu cuidado a matéria concernente às novas Faculdades de Ciências Naturais e de Matemática.
José Monteiro da Rocha era um apaixonado e dedicado estudioso de tudo em que se envolvia.
Encarregado da docência de Mecânica e Hidromecânica, mostrava uma vontade férrea de perceber, racional e cientificamente, o universo e tudo o que o rodeava.
Embora fosse um homem metódico, a verdade é que a sua vida encerrou algumas vicissitudes que o devem ter marcado profundamente.
A 27 de Janeiro de 1782, Monteiro da Rocha ganhava alguma notoriedade com a apresentação, à Academia Real das Ciências de Lisboa, de que era sócio-fundador e diretor da classe de Ciências de Cálculo, do estudo “Memória sobre a determinação das órbitas dos cometas”. Mas, os alcatruzes da vida, por vezes cruéis, levaram a que a publicação desta tese só fosse realizada em 1799, e não tinha tido o impacto que se esperaria e que merecia, porque entretanto, em 1787, o astrónomo alemão Olbers, propôs a resolução do mesmo problema com um método semelhante ao de Monteiro. Este facto contribuiu, significativamente, para que o trabalho exemplar de Monteiro da Rocha tenha passado despercebido no âmbito internacional. A História da Ciência atribui a Olbers a descoberta do primeiro método para a determinação dos parâmetros orbitais de um cometa em 1787, ou seja, cinco anos depois da comunicação de Monteiro da Rocha. Esta questão pode parecer-nos superficial, ou mesmo inóspita, mas no final do séc. XVIII, o problema das orbitais de cometas era profundamente importante, de tal forma que a Academia de Berlim atribuiu, em 1774, um prémio para quem fosse capaz de construir fórmulas gerais e rigorosas para determinar a órbita parabólica de um cometa.
Em 1782, Monteiro concorreu a um prémio proposto pela Academia de Lisboa. Competiu com Anastácio da Cunha e arrebatou-o. Três anos mais tarde, concorreu de novo e desta vez viu o seu nome envolvido em polémicas, após ter ganho outro prémio com um estudo que, segundo Anastácio da Cunha, seria uma cópia de um outro trabalho que este tinha entregue à Academia em 1780, acusando-o, portanto, de plágio. Esta questão, aliás, nunca foi totalmente esclarecida.
Em 1783, passou a reger a cadeira de Astronomia e doze anos mais tarde, embora tenha requerido a jubilação, foi convidado para ser o primeiro diretor do Observatório, cumulando esta honra com a de diretor da Faculdade de Matemática.
A vida foi-lhe sucedendo cheia de responsabilidade, às quais sempre soube dar a maior afeição e competência.
Chegou a vice-reitor da Universidade de Coimbra (1783-1801) e conselheiro do Príncipe da Regente D. João (futuro rei D. João VI).
Convidado, em 1799, para mestre do príncipe da Beira (futuro rei D. Pedro IV, de Portugal e primeiro imperador do Brasil) e dos restantes infantes, deixou Coimbra e fixou-se em Lisboa, em 1804. A sua ligação afetiva e intelectual ao príncipe herdeiro deveria ser relevante, pois aquando da sua morte, por testamento, legou-lhe a importante livraria que possuía e que, hoje, se encontra integrada no precioso acervo da biblioteca da Ajuda (os manuscritos deixou à Academia das Ciências).
Chegado à capital, passou, obviamente, a frequentar a corte, até que a família real partiu para o Brasil, aquando da invasão francesa.
Entretanto, para estar próximo do Paço e, possivelmente, ao mesmo tempo defender a sua privacidade e sossego, propícios ao estudo e reflexão científicos, adquiriu, no bucólico e arejado sítio de S. José de Ribamar, (então freguesia de Carnaxide) em Algés, uma quinta, com a respetiva mansão, com a respetiva mansão, para onde foi residir.
Na tranquilidade da Zona ribeirinha, do concelho de Oeiras, Monteiro da Rocha prosseguiu o seu trabalho de investigador científico, como algumas das suas obras impressas testemunham. A agitação da corte não exauriu o cientista. Tendo em conta a avaliação da Décima a que estava sujeita, a propriedade de S. José de Ribamar seria das mais importantes no local. A exploração do agro, fazia-a diretamente. Monteiro da Rocha aliaria ao gosto e hábito do estudo o prazer da lavoura. Foi, em São José de Ribamar, lavrador e cientista, portanto. José Monteiro da Rocha foi também autor e tradutor de um vasto rol de estudos. Alguns dos seus trabalhos, pese embora o longo tempo decorrido, têm atualidade. Ainda em 2000, foi editado, no Rio de Janeiro, o seu trabalho – notável para a época – “Sistema Físico-Matemático dos cometas”, cujo manuscrito data de 1760, quando tinha apenas 25 anos!
Homem de formação essencialmente autodidata, de ciência, de curiosidade e de vocação, morreu em S. José de Ribamar, Algés, em 11 de Dezembro de 1819. Contava então 85 anos.
ROCHA, Carla – «Monteiro da Rocha: matemático e astrónomo». Conhecer Oeiras nº 6. Oeiras: Câmara Municipal de Oeiras, 2004